Não
é um peditório, nem sequer uma recolha de donativos. O crowdfunding é um sistema de financiamento colaborativo, assente na
ideia de que a escassez de recursos individual pode transformar-se numa riqueza
coletiva que, por sua vez, se traduz em benefícios particulares. Porque
qualquer cidadão pode apoiar qualquer projeto de qualquer âmbito com qualquer
quantia, colaborando na sua realização e colhendo sempre o retorno duma
recompensa concreta.
Em
certo sentido, o crowdfunding
constitui uma alternativa aos modelos puramente capitalistas que ditam que só
quem dispõe de capacidade financeira à partida pode empreender projetos. Porém,
também não é uma espécie de coletivismo em que os participantes entreguem o seu
património particular num contributo para um bem geral indefinido. Prefiro
designá-lo como uma «comunidade de troca»: ao interessar-se por um projeto,
cada indivíduo participa com o valor que quer ou pode a fim de viabilizar a sua
concretização. Ao mesmo tempo, receberá o benefício de uma recompensa prevista.
É por isso que não faz um donativo, mas realiza um investimento. Não «perde»
dinheiro, mas adquire antecipadamente um bem ou serviço que lhe interessa,
tornando-se corresponsável pela realização de uma iniciativa que considera
válida e útil. Dir-se-á que, em contrapartida de se comprometer com um projeto,
«ganha» em duas frentes: na recompensa que recebe e na satisfação de ser
participante num empreendimento. É, pois, uma troca. Comunitária, porque
envolve muitas pessoas, conhecidas entre si ou não, unidas pela causa comum que
valorizam.
Esta
noção da troca, que rompe os limites de uma certa atual cultura individualista
(«não tenho nada a ver com o que os outros fazem») e desconfiada («quero é ver
o artigo pronto à minha frente antes de o comprar»), não é nova. Existiu em
todos os tempos da história humana, designadamente na Europa pré-industrial,
sob a forma das variadas redes de solidariedade que as populações criavam para
sobreviverem através da ajuda mútua. Limitadas pela imobilidade dos espaços
fechados do seu mundo e constrangidas pela submissão ao arbítrio de poderes
públicos ou privados, cultivavam o espírito comunitário de partilhar o que
tinham para ter acesso ao que precisavam e/ou desejavam.
A
revolução industrial, ao separar capital e trabalho naquilo que se designou por
modo de produção capitalista, tendeu a restringir a iniciativa social,
tornando-a específica de quem possuía os recursos económicos para ser
empreendedor e remetendo quem os não possuía à condição de simples obreiro a
troco de um salário. Sabemos como isto dividiu e opôs as populações,
contrariando o dinamismo da troca. A qual, não obstante, nunca desapareceu,
tendo porventura permanecido, muitas vezes, como a garantia de sobrevivência
dos mais pobres.
Hoje,
a globalização alarga os horizontes de comunidade e, assim, relança a urgência
da troca. E o seu alcance. E o seu poder. Na campanha de crowdfunding para publicação do meu livro Pena Máxima, houve apoios vindos de diferentes pontos do país,
colaborações de pessoas que não conheço pessoalmente e participações de amigos
em viagem ou residentes no estrangeiro. Todos terão o seu nome inscrito no
livro (primeira e mais imediata recompensa individual). Todos receberão as
restantes recompensas que lhes correspondem. E, pelo seu contributo, todos são
corresponsáveis, comigo e com a Editora Livros de Ontem, no empreendimento de
acrescentar a literatura portuguesa com mais uma obra.
Todos ganhamos. É isto o crowdfunding. Uma comunidade de troca e benefício. Em que, todos juntos, somos mais humanidade.
Todos ganhamos. É isto o crowdfunding. Uma comunidade de troca e benefício. Em que, todos juntos, somos mais humanidade.
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