Uma
mão estendida. Nada mais.
Venho
do punho cerrado e eis o que me tornei: uma mão estendida, palma aberta à
esperança que me foge, dedos recurvados na súplica que deixo escapar. Uma mão
estendida, largada das ideias que outrora a rechearam, acolhendo o vazio na
ilusão do tilintar oco do valor de moedas cada vez mais sem valor. Moedas que
mais não são que matéria episodicamente largada por outras mãos, fugidias de
descompromisso. Mãos distantes como o voo alto dos pássaros, insensíveis como
luvas de camurça. Mãos ciosas de uma riqueza defraudada, sacudidas na
espreitadela de uma dádiva de que logo se recolhem, protegidas na sua plenitude
enganada.
Uma
mão estendida, nada mais.
Venho
do punho erguido e a isto me reduzo agora: uma mão estendida, vencida pelos
olhares de inveja e rancor que a derrubaram, exposta aos olhos daqueles que já não
me olham, porque deixaram de ver pessoas. Dos pedestais de sucesso e bem estar
em que se equilibram à passagem, sentenciam-me na lógica de conquista em que
acreditam nas suas dúvidas, condenam-me à morte do esquecimento que apregoam na
retórica das suas vidas de aparato.
Uma
mão estendida. Implorante, mendicante, recetiva a tudo. Democrática. Vencida. A
pobreza não seleciona, aceita. A míngua é mais pródiga no acolhimento do que a
fartura é generosa na doação. E não é que a míngua precise mais de receber do
que a fartura merece dar, mas tem disso mais consciência. Que é, de resto, o
seu maior valor. E a sua tortura.
Uma
mão estendida. Nada mais.
É
a partir dela que me escrevo, agora. Sentindo o que sou. Sendo no que sinto.
Uma
mão estendida. Quarenta anos depois.
Que texto tão bonito!
ResponderEliminarO nosso Álvaro a crescer dia para dia.
Um beijinho gordo,
Maria Inês Pinto
Obrigado!
EliminarA escrita desenvolve-se também pela apreciação de quem lê.
Crescemos juntos!