No teatro, vejo o mundo ao contrário. Coloco-me no
inverso de mim, para vê-lo no reverso dos seus embustes. Na mentira criada no
palco revela-se a verdade escondida nas farsas quotidianas. Há uma
transparência genuína na aparente opacidade do jogo de luzes sobre a caixa
negra, uma honestidade pura nas subtis invenções do texto. Teatro é
sinceridade.
No teatro, vejo o mundo ao contrário. Coloco-me na
posição certa para desmontar a realidade obnubilada pela sombra das urgências
diárias. Troco as lentes da habitual redução fenomenológica e, assim, abro os
olhos para um todo maior. A ficção inventada no palco desenha o meu universo
factual com a máxima nitidez. Digo a minha essência em cada gesto que faço,
encontro-me no íntimo de todas as entoações com que falo. Teatro é verdade.
No teatro, vejo o mundo ao contrário. Sou mais eu
nesta forma de estar. Estou mais em mim nesta forma de ser. O mundo ao
contrário. Talvez a forma certa de olhá-lo.
Fotografia de Carlos Alberto Cavaco, no ensaio de Canto do Cisne... ou Talvez Não.
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