quarta-feira, 22 de março de 2017

Texto setuagésimo nono


Regressar ao palco. Entrar, fincar os pés na arena, erguer-me do meu chão, pisar as nuvens, explodir-me em presença. Descontrair o corpo, concentrar o espírito. Libertar os deuses que me habitam, descobri-los sob as máscaras de mim. Perder-me.
 Regressar ao palco. Senti-lo dentro. Deixar o antigo inexplicável frenesim de quietude tomar conta de mim, outra vez. Concentrar o corpo, descontrair o espírito. Observar-me no olhar em volta, medir o espaço, fruir o tempo. Saborear a Palavra que se faz texto à minha vista, incorporar o texto que se faz Palavra no meu íntimo. Encontrar-me.
Regressar ao palco. Erguer de novo o gesto, abraçar o rito que me corre nas veias. Soltar enfim a Palavra, transcender a Vida. Ser outro em mim, fazer-me outros no que sou, ser eu próprio nos outros que em mim se fazem. Entregar-me.
Regressar ao palco. Partilhar. Celebrar a Vida que criamos, que transborda de nós e nos une. Imaginar e ser maior. Criar mundos. Acrescentar-me.
Regressar ao palco. Fazer teatro. Salvar-me.

Fotografia de Carlos Alberto Cavaco, no ensaio de Canto do Cisne... ou Talvez Não.

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