Porquê o teatro? Porque não lançar-me em escaladas
de sucesso, converter-me à volúpia dos mil ecrãs luminosos manipuladores,
janelas ambíguas que me descobrem o mundo e escondem o homem, desterros
solitários em miragens de omnipresença?
Porquê o teatro? Porque não ceder ao consolo das
obesidades fáceis, dos arrotos de fartura em mecanismos de aposta e lucro, ao
invés deste desgaste de buscar um Belo que outros apreciem, desta consumição na
insaciedade provocante?
Porquê o teatro? Porque não sumir-me na perna
traçada de impávidas poltronas, calando o sopro inspirador que me empurra de
dentro? Porque não fingir a rouquidão cinzenta inopinável, bronzeada e
liquefeita, ao invés deste arrepio gritante, deste silêncio crispado
ensurdecedor que sonha contagiar-se como hálito vivificante?
Porquê o teatro? Porque não respirar fundo na
atenção repartida das multidões, dissipando a artilharia dos olhares curiosos
nas quotidianas solidões acompanhadas? Porque não preservar o retrato anódino
numa circunspeção aparentemente respeitosa, ao invés desta coragem de extinção
no desnudamento, desta insanidade de abrir o corpo a todas as balas, disposto a
qualquer aniquilamento de amor e crítica?
Porquê? Porquê um monólogo num palco de teatro?
Porque não conservar-me o mais possível numa morte em que prolongadamente
exista, ao invés de viver plenamente uma vida em que me morro a cada dia?
E porque não?... Se prefiro morrer-me numa vida
desejada ao invés de apenas existir numa morte aceite…
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