O caminho estreito alcatroado entrava-lhe pelos
olhos dentro na vastidão com que se lhe estendia pela frente. O menino largou a
mão do avô e ficou estático na contemplação daquele rumo sinuoso. Havia um
banco na berma, junto à valeta empedrada, um ornamento de ferros pintados de
negro servindo de estrutura à simplicidade de duas pranchas vermelhas. O avô
sentou-se, descansou a sabedoria que dele transbordava na paciência de observar
o menino, sorriso resplandecente de olhar o inexorável destino que se lhe
desenrolava diante.
O menino moveu a cabeça, rodou o olhar pelas
árvores em volta: identificou os eucaliptos, conhecia-lhes a altura implacável,
sabia-lhes a inconfundível curvatura das folhas derramadas pelo chão,
atapetando a terra húmida, fundindo-se nela em harmonia perfumada. Os aromas… E
havia também as bagas, graciosas e duras, que muitas vezes caíam no caminho
onde ele se desabituara de pontapeá-las desde que o avô lhe ensinara que não se
agride a natureza a que pertencemos.
Entre os eucaliptos rareavam pinheiros teimosos,
vestígios da anterior vegetação dominante, segundo o avô contara. O menino
achava-os mais bonitos do que os eucaliptos, o tronco mais castanho, a ramagem
mais frondosa, a caruma mais verde. E as pinhas, fantásticas obras de arte que
ele tantas vezes recolhia e levava para casa, onde certa vez o seu pai se
lembrara de, escolhendo as mais perfeitas, pintá-las em tons de oiro e prata
para adornarem a base da árvore de Natal.
Voltou a fixar o olhar no caminho à sua frente, mas
os sentidos vagueavam-lhe agora pelos sons, o vento versejando por entre os
ramos, o chilreio de pássaros diversos fornecendo rimas àquele universo
poético. Concentrou todo o seu tato nas plantas dos pés, sentiu a terra
subir-lhe pelo corpo, crescer por ele e possuí-lo em todo um hino da criação.
Parecendo distraído, o avô eternizou-se em breves
segundos de contemplação, grato pelo imenso mundo interior que transparecia no
menino, pelo universo de sensibilidade que o habitava. Depois levantou-se
devagar, aproximou-se. O menino olhou-o com aquela veneração inocente que
sempre lhe escorria dos olhos. O avô passou-lhe a mão pela cabeça, numa carícia
deslumbrada. E disse:
— Hás de escrever isto, um dia.
Tomou-o pela mão e continuaram o passeio pela mata.
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