Já
me fui embora das roupas que me tornavam visível. Há um abandono de pregas
desordenadas, uma inutilidade de biqueiras alinhadas, um vazio. Histórias
incompletas de uma vida que acabou. Uma ausência, um desejo de mais, uma
saudade. O que resta de nós quando nos vamos sem aviso? O que fica no aviso com
que premeditamos uma inevitável partida?
Já
me fui embora das roupas que me tornavam visível. Há um luto que alastra como
enchente poluída, todas as cores se diluem num desgosto negro sem voz, a
própria luz de tudo parece sufocar no tenebrismo opaco de nada mais.
Já
me fui embora das roupas que me tornavam visível. Mas as memórias todas chovem
teimosas, ensopam a secura das vestes na humidade dos passados que ainda, as tábuas
do soalho absorvem a muda transparência do meu corpo que já não. Pleno é o meu
nome na boca de todas as lembranças, a interpelação luminosa que inunda o oco
negrume da ausência, a ânsia de ficar.
Já
me fui embora das roupas que me tornavam visível, grito-me em tudo o que resta
na ânsia de ficar. Entre a brevidade e o eterno, permaneço afinal?
(Fotografia de Jorge Figueiredo)
(Fotografia de Jorge Figueiredo)
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