domingo, 20 de novembro de 2016

Texto setuagésimo segundo

O teatro é o espelho da vida. Dramaturgos, encenadores e atores (ajudados por todas as equipas técnicas e de produção) transportamos o mundo real para o palco, recriamo-lo em maneira artística, transformamos os factos em teatro. E convidamos o público a ver, de certa forma obrigamo-lo a ver-se no que vê, fazemo-lo sair da sua realidade para confrontá-la e, assim, regressar a ela muito mais. Reconciliado? Ou revoltado?...
O teatro é o espelho da vida. Ou o contrário. Dramaturgos, encenadores e atores (ajudados por todas as equipas técnicas e de produção), ao transformarmos a realidade em arte somos transformados por ela: de modo fugaz e inócuo, primeiro, como num sonho que se esquece quando dele se acorda; a seguir mais profundamente, com a insistência refletida da continuidade; por fim, de modo visceral, porque o mergulho no abismo de luz se torna um vício e tudo em nós (mente, espírito e corpo, razão, emoções e desejos) depende dele. E convidamos o público a esta metamorfose. Porque é linda.
A vida é o espelho do teatro. E o contrário. O Autor, de Tim Crouch, escreve-se na fronteira desta dicotomia. E a versão do Palco Treze (em cena no Auditório Fernando Lopes Graça, no Parque Palmela, em Cascais) joga esta escrita numa espécie de tabuleiro de xadrez sem quadrículas marcadas, onde o movimento de todas as peças parece entregue ao livre-arbítrio de cada uma, que nunca está sozinha. É assim a vida, por que razão não há de ser assim o teatro? Liberdade e coragem. E relação. É assim o teatro, por que razão não há de ser assim a vida?
É excelente o processo (não consigo chamar-lhe espetáculo!...) do Palco Treze: honesto na simplicidade da dramaturgia, audacioso na «crueldade» da encenação, verdadeiro na exposição dos atores. Envolvente na subtileza com que mergulha o público no «tanque de flutuação» do jogo de espelhos. Perturbador.
O teatro é o espelho da vida. Ou o seu contrário. Por isso precisamos tanto dele. Liberdade e coragem. E relação. Sermos autores de nós próprios. Com os outros.

2 comentários:

  1. Em nome da PALCO13, agradeço as suas palavras e congratulo-me por um trabalho que nos deu tanto prazer criar - se bem que não isento de muitas dificuldades - tenha o impacto que refere. Ainda bem, quer dizer que conseguimos o nosso objectivo. Bem haja!

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    1. Bem hajam vocês, Palco 13! E todos os artífices do teatro - e das outras artes - que continuam a enfrentar e vencer dificuldades para criar obras de impacto. Sem o teatro - e as outras artes - a nossa sociedade ficaria reduzida a um mero mecanismo de sobrevivências.
      Continuemos!

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