sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Dizer a Imagem 1: Restos


Que farei do teu gosto deixado em restos nas travessas? Que farei da jarra vazia da tua beleza, da prisão das laranjas que me lembra o sumo matinal, a vitamina de acordar a teu lado?
Que farei da luz em que já não me entras casa adentro? Que farei do clarão que conservo refletido nas coisas, a devolução do olhar com que pinto a esperança de ti na paisagem que imagino para lá da porta fechada dos teus passos? Que farei deste retalho quadriculado, ânsia cada vez mais vã de que voltes um dia?
Que farei desta espera de copo vazio? Que farei deste definhamento enganado na boa forma da revista, destas paredes que escorrem o brilho branco da saudade de nos roçarmos nelas?
Que farei do abandono da chave do carro, renúncia de ir buscar-te por não saber aonde?
Que farei, enfim, desta imagem desgastada do meu cansaço de olhá-la, manchada da minha desistência de acreditar que um dia voltarás?
Que farei, quando nada resta? Que farei, quando tudo são restos?

(Fotografia de Jorge Figueiredo)

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