terça-feira, 25 de junho de 2013

Texto oitavo

Noite. Os ponteiros fosforescentes do relógio desenham as três e meia. O silêncio invade o espaço todo que a escuridão embrulha. Como sempre, ele não consegue dormir. Levanta-se da cama, ergue o seu corpo do estrado que protesta a sua insónia num rangido acusatório. Olha brevemente para a tranquilidade, no outro lado da cama. O espesso invólucro da noite mal deixa entrever a beleza dela, derramada entre os lençóis naquele corpo maduro, delicado e provocante, naquele espírito elevado, voluntarioso e sensível. E, dentro dele, há um impasse de ternura no coração sobressaltado.
Afasta-se, sai do quarto. Percorre a casa de olhos bem abertos no escuro, atento à impossibilidade de ver com clareza.
O sofá da sala sufoca um queixume ao sofrer o acolhimento do seu corpo pesado. Ele ali fica, sem pressa, libertando o espírito no tempo que escorre, saboreando lentamente a insónia resignada que é, para ele, a contrapartida noturna de não ser indiferente às coisas, durante o dia.
Não acende a luz. Deixa uma ténue esperança brilhar no escuro ou sonhar com isso: talvez daquela solidão nasça alguma coisa que valha a pena escrever.
Talvez eu queira.

Sem comentários:

Enviar um comentário